Afinal, a cannabis é psicodélica?
Será que toda vegetal que expande a consciência pode ser chamada de psicodélica? A resposta, uma vez que muitas outras na medicina, não é simples. Há séculos, a cannabis acompanha a humanidade em rituais, curas e descobertas pessoais. Mas, à luz da neurociência contemporânea, ela compartilha os mesmos caminhos que o LSD, a psilocibina ou o DMT? Ou trilha uma estrada distinta, embora paralela, na complexa geografia da consciência?
Para entender essa nuance, conversamos com o médico anestesista Dr. Renato Muniz Giaccio, que atua com substâncias psicodélicas e acompanhou pesquisas sobre seus usos terapêuticos.
A diferença entre o “psicoativo” e o “psicodélico”

De inopino, o médico é terminante ao declarar: “A maconha, ou cannabis, é frequentemente classificada uma vez que uma substância psicoativa e psicotrópica, mas não é tradicionalmente considerada uma substância psicodélica clássica”.
Ou seja, apesar de modificar percepção, humor e cognição, que são características típicas dos psicodélicos, a cannabis se comporta de forma dissemelhante no cérebro. Enquanto os chamados psicodélicos clássicos, uma vez que o LSD ou a psilocibina, atuam sobre os receptores 5HT2A do sistema serotoninérgico, os fitocanabinoides da maconha (uma vez que o THC e o CBD) se ligam a receptores do sistema endocanabinoide, mormente os CB1 e CB2.
Essa diferença de atuação impacta diretamente na qualidade e profundidade das experiências proporcionadas por essas substâncias.
A cannabis altera a consciência? Sim. Mas em outra chave.
Segundo Renato, a experiência subjetiva com a cannabis é real, significativa e válida, mas menos intensa e menos “transformadora” que as vividas com psicodélicos clássicos. “A cannabis pode gerar euforia, relaxamento, aumento da percepção sensorial e distorção do tempo, mas os psicodélicos clássicos geralmente provocam alucinações visuais e uma mudança profunda na percepção de si mesmo e da veras”, explica.
Tanto a cannabis quanto os psicodélicos, no entanto, devem ser usados com responsabilidade. Ambas as experiências podem ser ansiogênicas, mormente em contextos inadequados.
Entre templos e terapias: a tradição místico da cannabis
Desde os antigos rituais hindus até cerimônias rastafáris, a cannabis tem sido associada ao sagrado. Essa conexão, segundo Dr. Renato, revela o seu potencial de expandir a consciência, mas com uma salvaguarda: “As práticas de rituais podem facilitar experiências subjetivas que promovem conexão místico e introspecção, embora o caráter dessas experiências possa variar em intensidade quando comparado à psicodélicos”. Ou seja, o rito, o envolvente e a intenção desempenham papéis fundamentais na jornada com a cannabis, assim uma vez que ocorre com os psicodélicos.
Potencial terapêutico: entre promessas e limites
Sabemos que, na medicina, a cannabis já mostra bons resultados no tratamento de sofreguidão, dor crônica e até quadros de depressão ligeiro. Mas quando o objecto é depressão resistente, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) ou sofreguidão existencial profunda, as evidências são mais tímidas.
“A cannabis tem mostrado potencial terapêutico em algumas condições psiquiátricas, com estudos indicando benefícios para a sofreguidão, dor crônica e, em alguns casos, depressão. No entanto, as evidências do seu papel uma vez que um tratamento para condições uma vez que depressão resistente ou TEPT ainda é limitada quando comparada aos psicodélicos, que têm demonstrado resultados mais robustos, uma vez que é o caso da Cetamina, um psicodélico dissociativo, que já é considerado primeira risca no tratamento da ideação suicida e segunda risca no tratamento da depressão resistente”, avalia o médico.
O que é, portanto, a cannabis?
Talvez a resposta mais honesta seja: depende do olhar. Para uns, é tratamento. Para outros, ritual. Para a ciência, é uma vegetal complexa, que ativa sistemas únicos no corpo humano e pode, sim, induzir estados de consciência transformado. Não é LSD, nem DMT, nem ayahuasca. Mas também não é unicamente uma substância recreativa. É cannabis. Com sua história, seus mistérios e sua potência.
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